domingo, 14 de julho de 2013

4. O LADO ESCURO DOS FRÉONS

O entusiasmo em torno dos CFCs durou até 1974, quando achados inquietantes foram anunciados pelos pesquisadores Sherwood Rowland e Mario Molina, numa reunião da American Chemical Society em Atlanta. Eles haviam descoberto que a própria estabilidade dos CFCs representava um problema totalmente inesperado e perturbador.

Ao contrário de compostos menos estáveis, os CFCs não se decompõem por reações químicas comuns, propriedade que de início os fizera parecer extremamente atraentes. Os CFCs liberados na camada mais baixa da atmosfera circulam de um lugar para outro durante anos, ou mesmo décadas, até finalmente subir para a estratosfera, onde são rompidos pela radiação solar. Há uma camada na estratosfera que se estende de cerca de 15 a 30Km acima da superfície da Terra, conhecida como camada de ozônio. Isso pode dar a ideia de que esta é uma camada bastante grossa, mas se a mesma camada existisse sob as pressões verificadas no nível do mar, ela mediria apenas milímetros. Na região rarefeita da estratosfera, a pressão do ar e tão baixa que a camada de ozônio se expande vastamente.


O ozônio é uma forma elementar de oxigênio. A única diferença entre estas formas é o número de átomos de oxigênio em cada molécula —oxigênio é O2 e ozônio é O3 —, mas as duas têm propriedades bastante diferentes. Muito acima da camada de ozônio, a intensa radiação proveniente do sol rompe a ligação numa molécula de oxigênio, produzindo dois átomos de oxigênio:


Esses átomos flutuam para baixo até a camada de ozônio, onde cada um reage com outra molécula de oxigênio para formar ozônio.


Dentro da camada de ozônio, moléculas de ozônio são fragmentadas pela radiação ultravioleta de alta energia, para formar uma molécula de oxigênio e um átomo de oxigênio.


Dois átomos de oxigênio recombinam-se então para formar a molécula O2:


A camada de ozônio, portanto é constantemente formada e constantemente rompida. Ao longo de milênios esses dois processos alcançaram um equilíbrio, de modo que a concentração de ozônio na atmosfera terrestre permanece relativamente constante. Esse arranjo tem importantes conseqüências para a vida na terra; o ozônio da camada de ozônio absorve a parte do espectro ultravioleta vindo do sol que é mais prejudicial aos seres vivos. Já se disse que vivemos sob um guarda-chuva de ozônio que nos protege da radiação do sol.

Mas os achados das pesquisas de Rowland e Molina mostraram que átomos de cloro aumentam a taxa de fragmentação das moléculas de ozônio. Numa primeira etapa, átomos de cloro colidem com ozônio para formar uma molécula de monóxido de cloro (C1O), deixando atrás de si uma molécula de oxigênio.


Na etapa seguinte, o C10 reage com um átomo de oxigênio para formar uma molécula de oxigênio e regenera o átomo de cloro:


Rowland e Molina sugeriram que essa reação generalizada podia perturbar o equilíbrio entre as moléculas de ozônio e oxigênio, uma vez que átomos do cloro aceleram a ruptura do ozônio mas não têm nenhum efeito sobre sua produção. Um átomo de cloro consumido na primeira etapa da decomposição do ozônio e produzido novamente na segunda etapa atua como um catalisador, isto é, aumenta a taxa de reação, mas ele mesmo não é consumido. Este o aspecto mais alarmante do efeito dos átomos de cloro sobre a camada de ozônio — o problema não é que as moléculas de ozônio são destruídas pelo cloro, mas que um mesmo átomo de cloro pode catalisar essa fragmentação um sem-número de vezes. Segundo uma estimativa, cada átomo de cloro que chega à atmosfera superior através de uma molécula de CFC destrói, em média, cem mil moléculas de ozônio antes de ser desativada. Para cada 1% de redução da camada de ozônio, mais 2% de radiação ultravioleta nociva poderia penetrar na atmosfera da Terra.

Com base em seus resultados experimentais, Rowland e Molina previram que átomos de cloro dos CFCs e compostos relacionado iriam, ao chegar a estratosfera, iniciar a decomposição da camada de ozônio. Na época em que suas pesquisas foram feitas, bilhões de moléculas de CFC eram liberadas na atmosfera diariamente. A informação de que os CFCs representavam um perigoreal e imediato de destruição da camada de ozônio e uma ameaça à saúde e à segurança de todos os seres vivos inspirou certa preocupação, mas vários anos se passaram — e novos estudos, relatórios, forças-tarefa, reduções progressivas voluntárias, interdições — antes que os CFCs fossem completamente abolidos.

Dados de uma fonte inteiramente inesperada geraram a vontade política proibir os CFCs. Estudos feitos na Antártida em 1985 mostraram uma red çau crescente da camada de ozônio sobre o pólo Sul. A constatação de que o maior dos chamados "buracos" na camada de ozônio aparecia no inverno sobre um continente praticamente desabitado — não havia grande necessidade de usar refrigerantes ou laquês na Antártida — foi desconcertante. Significava obviamente que a liberação de CFCs no meio ambiente era um problema global, não apenas uma preocupação localizada. Em 1987, um avião de pesquisa de grande altitude que voava sobre a região do pólo Sul encontrou moléculas de monóxido de cloro (ClO) nas áreas de ozônio reduzido — assim, foram comprovadas experimentalmente as previsões de Rowland e Molina (que oito anos depois, em 1955, partilharam o Prêmio Nobel de Química pela identificação dos efeitos de longo prazo dos CFCs na estratosfera e no meio).

Em 1987, um acordo chamado Protocolo de Montreal exigiu que todas as nações signatárias se comprometessem a reduzir gradualmente o uso dos CFCs até sua completa eliminação. Hoje usam-se como refrigerantes os compostos hidrofluorcarbonetos e hidroclorofluorcarbonetos, em vez dos clorofluorcarbonetos. Essas substâncias não contêm cloro ou são mais facilmente oxidadas na atmosfera. Só uma pequena porção chega aos elevados níveis estratosféricos que os menos reativos CFCs alcançavam. Mas os novos substitutos dos CFCs não são refrigerantes tão eficazes e requerem até 3% mais de energia para o ciclo de refrigeração. Ainda há bilhões de moléculas de CFC na atmosfera. Nem todos os países assinaram o Protocolo de Montreal, e entre os que o fizeram, ainda restam milhões de refrigeradores contendo CFC em uso e provavelmente centenas de milhares de aparelhos velhos abandonados que deixam vazar CFCs na atmosfera, onde se juntarão aos CFCs restantes em lenta mas inevitável ascensão para produzir estragos na camada de ozônio. O efeito dessas moléculas antes tão louvadas poderá ser sentido por centenas da anos no futuro. Quando a intensidade da radiação ultravioleta de alta energia que atinge a superfície da terra aumenta, o potencial de dano para as células e suas moléculas de DNA — levando a níveis mais elevados de câncer e a maiores taxas de mutação — também aumenta.








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